A opinião do pesquisador e historiador sobre os acontecimentos do carnaval

Análise dos desfiles das escolas do Grupo de Acesso de Niterói


Análise e notas do Professor para os desfiles das escolas de Samba do Grupo de Acesso de Niterói, realizado na segunda-feira, 11 de fevereiro na Rua da Conceição.

Cacique da São José apresentou bom conjunto de fantasias
Cacique da São José -   Comissão de frente veio com estética indígena e teve boa apresentação coreográfica. Alegoria com bom acabamento trazia o Cacique maior, representando o símbolo da escola. O casal de mestre sala e porta bandeira vieram escoltados por guardiões que os protegiam. Escola mostrou um desfile muito coeso, nas suas alas, desfilando compacta e com bom ritmo. Nota 9.5.


-      Império de Araribóia - Apresentou a alegoria mais inventiva e original, trazia a réplica de uma favela. Comissão de frente teve coreografia vacilante durante a sua apresentação. A bateria teve um ritmo muito estranho, acelerada de mais, acabou prejudicando o andamento do samba enredo. Nota 7,0.

3-      Souza Soares – Escola veio contando os seus cinqüenta anos de história, com um samba de boa linha melódica, a veterana Souza Soares, apesar de reduzida no numero de componentes, fez um desfile com muita garra. Nota 7,5.

4-      Magnólia Brasil – Agremiação, não teve muita sorte no seu desfile. Fez uma opção arriscada, de colocar comissão de frente e casal de mestre sala e porta bandeira, uma atrás da outra, abrindo o desfile da escola. O resultado disso foi desastroso. As coreografias terminavam em tempo distintos, abrindo assim um clarão visível no desfile da escola. Sem contar com um imprevisto, de uma ambulância que entrou por dentro das alas, fazendo a escola parar seu desfile. Nota 6,0.

5-       Garra de Ouro – Apresentou um bom samba enredo, acompanhado de uma afinada bateria que teve, nos seus tamborins seu ponto forte. Suas alegorias deixaram muito a desejar no acabamento e estética. Veio com apenas nove baianas, número inferior ao permitido pelo regulamento. Nota 7,0.

6-      Unidos do Sacramento - A agremiação única representante de São Gonçalo no desfile do acesso de Niterói apresentou uma discrepância em seu desfile. Veio com o maior contingente de baianas da noite vinte e cinco no total. Muito bem vestida esta ala se contrastou, com o restante da escola, que veio com fantasias bem modestas. O interprete da escola, sozinho no carro de som e vestindo uma camisa de outra agremiação carnavalesca, teve dificuldades de levar o canto até o final. Nota 5,0.

7-      Bem amado- Entrou na Rua da Conceição, com quase uma hora de atraso. Apresentou o único carro alegórico acoplado do desfile. Com um enredo afro esta escola, apresentou um número reduzido de componentes que tiveram dificuldade de levar o bom samba enredo da escola. Nota 6,0.

União da Engenhoca – Com a responsabilidade de fechar o desfile, a Engenhoca a exemplo do ano passado apresentou muitos problemas na sua passagem pela Rua da Conceição. Reeditando um enredo da inesquecível Corações Unidos, a escola apresentou o melhor samba enredo da noite, que deu um ar de nostalgia no desfile. O público cantou o samba da Engenhoca. Mais infelizmente só o samba não vai ser suficiente para tirar o título de pior escola a se apresentar na noite de ontem. Com um número ínfimo de componentes e alegorias inacabadas e fora do contexto do enredo a escola é séria candidata ao último lugar no grupo. A ressaltar de positivo além do samba, foi a Comissão de frente da Engenhoca que trouxe pretas velhas e mãe de santo, dando mais uma vez um ar de carnaval do passado no desfile da escola. Nota 4,0 .  

Unidos do Jacarezinho: Força, raça, poesia e samba no pé


      Tem um verso muito conhecido de um samba alusivo da Unidos do jacarezinho que Diz assim. “ninguém segura meu jacaré, meu jacaré, tem poesia e samba no pé”.                 
      Pesquisando cuidadosamente a obra musical desta magnífica escola de samba, pude constatar que estes versos reproduzem fielmente uma das características mais marcantes da Jacarezinho, que é o lirismo poético aliado a um ritmo peculiar que faz seus sambas se tornar um dos mais singulares da história do samba enredo.
       Fruto da fusão de três agremiações da região, Unidos do Morro azul, Unidos do Jacaré e do bloco Não tem Mosquito, a Jacarezinho tem uma história calcada na força da sua comunidade, basicamente de maioria negra e proletária e de uma profícua e talentosa ala de compositores que tem no seu quadro, figuras como nada mais nada menos, que Monarco, Bené do Feitiço, Nonô e o imortal Barbeirinho do Jacarezinho.
       Em 1970 estreando como debutante entre as grandes do Rio a pequenina Jacarezinho já dava seu bom cartão de visita , mostrando com o belíssimo samba enredo O Fabuloso Mundo do Circo, que ela compensaria sua falta de grana para fazer seus desfiles plásticos, desfilando obras musicais que tocariam a alma do sambista carioca. Este samba de autoria da dupla de compositores da escola Marcos e Sarabanda pode ser considerado um clássico do gênero. A melodia é baseada nas cantigas de roda e tem no laiá laiá uma marca da sua identidade musical, que vai aparecer constantemente nos outros sambas da agremiação.
       Durante o restante da década de 70 a Jacarezinho foi desfilando vários sambas de alto nível, mas eu destaco dois como obras fenomenais. O primeiro é Catarina Mina de 1975 neste enredo o jacaré, conta a quase desconhecida história da sensual e bela escrava Catarina Mina, que usou o seu corpo e seu amor para negociar sua participação na sociedade maranhense colonial. Eis um dos estribilhos deste belo samba.
                               Olha o boi bumba
                               Olha o Catimbó
                               Salve o batuque
                               No terreiro da vovó.
         Rode compositor solitário desta obra, recorre como de costume da ala de compositores da escola, as cantigas populares para ilustrar suas poesias.
          Em 1976 a Jacarezinho desceu para defender mais um belo samba enredo, se tratava de Canudos, sua história, sua gente. Engraçado, é que neste mesmo ano, outra escola tão popular como a Jacarezinho, a Em Cima da Hora, emplacava também um dos sambas, mas bonitos do carnaval carioca, Os Sertões que a exemplo da Jacarezinho abordava a carnificina proporcionada pelas elites brasileiras para acabar com a obra social criada por Conselheiro e seu povo. Talvez pela grandeza do samba da Em Cima da Hora , pouca gente nota a qualidade deste samba da Jacarezinho. O que tem de mais singular e fantástico neste samba é, o seu refrão principal.
                              Oh virgem do Rosário
                              Senhora do mundo
                              Dê- me um coco d´agua
                              Senão eu vou ao fundo.
          Guaraci, Meireles, Moreira e Thompson são de uma felicidade poética fora do comum, carnavaliza a prece que o pessoal de Canudos clamava nas horas mais críticas de embate contra as forças do Estado reacionário. Belo!

          Nos anos 80 chega para administrar a escola mestre Monarco, com ele, começa uma fase de homenagens a grandes compositores da nossa música popular, em 1981 a escola leva para avenida o enredo Paulo da Portela, a majestade do samba. Em 1982 é a vez de homenagear Geraldo Pereira e finalmente vem à coroação com o enredo Candeia, a luz da inspiração, que deu a escola o título de campeã do extinto grupo 1B o acesso dá época que dava ascensão ao grupo principal.
        Com esta justa homenagem a um dos homens mais politizados do mundo do samba, mestre Candeia, a Jacarezinho produz mais uma obra prima musical. Com um samba sério, nostálgico e de exaltação, a verde rosa do Jacaré, sensibiliza toda a passarela do samba ao passar com este cântico já nas primeiras horas da manhã de domingo de carnaval. No tom dos versos do samba de Bené Feitiço, Pedrinho Total, Zé Leitão, Vilmar e Marquinho Mancha, a Jacarezinho, apresenta um desfile em tom menor e uma apresentação plástica comandada pelo carnavalesco Flávio Tavares que leva aos jurados a não terem dúvida da campeã do acesso de 86. A pesar dos protestos feitos pela Acadêmicos do Engenho da Rainha ao Presidente da extinta Rio Tur Trajano Ribeiro em relação a uma nota 7 recebida pela bateria da escola. Lamentações e polemicas não podem macular este campeonato da Jacarezinho.
       Para finalizar, quero dizer, que esta reflexão sobre esta bela agremiação carnavalesca chamada Unidos do Jacarezinho, visa também, além de mostrar o valor cultural desta favela fantástica, que foi e ainda é responsável pela liberação de grande parte de trabalhadores que vão vender sua força de trabalho para os magnatas da zona sul, mas que como vimos ajudou a escrever uma bonita pagina da história do samba carioca.
       A favela do Jacarezinho não é só tráfico e miséria como mostra a mídia burguesa todos os dias, por trás desta realidade mórbida produzida pelo capitalismo excludente se esconde, uma bela história de amor chamada Grêmio Recreativo escola de samba Unidos do Jacarezinho. 

A queda do Tigre


   Uma das coisas que me chamou a atenção no desfile deste ano do grupo especial do Rio de Janeiro, foi à queda da nossa Unidos do Porto da Pedra, o tigre de São Gonçalo. 
    Antes de abordar e analisar os motivos que levaram ao rebaixamento da escola quero sintetizar, um pouco da história desta importante agremiação carnavalesca. 
    Depois de passar pelas experiências de bloco de embalo e de enredo, a Porto da Pedra, se transformou em 1981 numa Escola de Samba.
    As primeiras apresentações foram realizadas no carnaval de rua do município de São Gonçalo. Entre 1985 e 1992, a agremiação desfilou apenas pelas ruas do seu bairro de origem, a partir de 1993, com a força da sua comunidade a escola começou a se organizar, adotando o tigre como símbolo e arrumando o barracão para atravessar a Baía de Guanabara e desfilar seu talento entre as escolas do Rio de Janeiro.
      Quis o destino no ano em que a Porto da Pedra faz 10 anos desfilando ininterruptamente no grupo seleto das escolas de samba do Rio, que o tigre amargasse o gosto da queda. Queda esta, anunciada por toda a crítica especializada em carnaval, numa espécie de tragédia anunciada, desde que a escola escolheu o iogurte como tema do seu carnaval para 2012.
       Ouvi uma entrevista do querido presidente da Porto da Pedra, reclamando de um possível pré-linchamento por parte da opinião pública em relação à escolha do enredo da escola, que ao ver dele influenciou na decisão dos jurados em rebaixar a escola de São Gonçalo.
        Com todo respeito que a opinião do presidente da Porto da Pedra me mereça, vou pedir licença para discordar dela. Não acho que a opinião pública tenha influenciado na decisão do jurado. O que houve é que, a análise feita ao enredo da escola antes do carnaval, se transformou em constatação no desfile da Marques de Sapucaí e no julgamento do jurados. Ou seja, o enredo sobre o Iogurte, embora possa ter rendido boas finanças para a escola, prejudicou muito a mesma como tema artístico de desfile. Com exceção da fabulosa bateria, as notas que a escola conseguiu foram muito baixas em relação às outras concorrentes. E em minha opinião isso se explica muito pelo fato do tema escolhido pela escola para ser o enredo, não sustentou o desfile da agremiação.
    Já falei isto varias vezes quando comento carnaval, não sou contra o enredo patrocinado. Vivemos infelizmente numa sociedade capitalista, mas o enredo patrocinado tem que gerar um tema de qualidade. Para isto acontecer ele deve ter um conteúdo consistente que gere um bom samba enredo e um desenvolvimento na avenida bem criativo e desenvolto.
    Infelizmente o tema iogurte não proporcionou nenhuma vantagem para a Porto da Pedra no aspecto carnavalesco porque, era muito fraco. 
    Que a Porto da Pedra com a força do seu chão possa repetir no grupo de acesso, apresentações brilhantes como no passado recente e, com isto voltar ao grupo especial. 

Colunista analisa os ensaios da Inocentes de Belford Roxo, Porto da Pedra e Vila Isabel

Ellen Roche mais uma vez brilho à frente da bateria da Porto da Pedra
                 No ultimo final de semana tivemos mais uma seqüência dos ensaios técnicos na Marquês de Sapucaí. No sábado Inocentes de Belford Roxo e Unidos do Porto da Pedra não empolgaram o público que compareceu ao evento. 
                  A escola da Baixada Fluminense fez um desfile esforçado, dentro das suas modestas possibilidades. O enredo que fala de Corumbá e com forte conotação indígena e nacional me agrada muito. O samba é valente, tem muita força e contempla bem o enredo da escola.
               A querida escola de São Gonçalo, a nossa Porto da Pedra vem com enredo muito questionável, pois fala do iogurte que convenhamos não dar samba. Tanto que o samba enredo da Porto da Pedra está sendo considerado o mais fraco da safra do grupo especial. Mesmo assim a comunidade de São Gonçalo abraçou o samba e soltou os pulmões na avenida. O destaque do ensaio do tigre foi sua magistral bateria que tendo a frente à esfuziante e bela Ellen Roche deu um banho de ritmo e beleza na avenida.
               No domingo assisti aos ensaios de Grande Rio e Vila Isabel. A escola de Caxias, a exemplo da Porto da Pedra tem um samba sofrível, mas que a comunidade abraçou. O enredo da Grande Rio que fala da superação e, tem um toque diferente que pode dar certo e emocionar o público no dia do desfile. Sobre o ensaio propriamente, a Grande Rio teve um problema com seu carro de som que pifou na avenida. Não se entendia sequer se distinguir o cavaco e o violão um do outro. Depois que passou a bateria, o ensaio caiu muito, pois a escola que até aquele momento vinha numa empolgação notável simplesmente parou de cantar e interagir com o público, que lotava as arquibancadas da Sapucaí.
              Para encerrar os ensaios deste final de semana veio a Vila Isabel. Com enredo que fala dos nossos irmãos angolanos a Vila fez um ensaio com a marca da sua comunidade. Com muita garra, samba no pé e na ponta da língua. E por falar no samba da Vila, ele trás o contra canto como novidade este ano. Para quem não sabe, o contra canto é quando o puxador da escola canta uma parte do samba e passa a outra parte para o coro da escola cantar. Ocorrendo assim o contra canto. Engraçado que a Vila fez isto no ensaio e se propõem a faze- lô no dia do desfile. No ensaio ficou direitinho vamos ver se vai funcionar no dia. Como a Vila é uma escola que ensaia muito e organizada acho que vai funcionar. Ainda sobre o samba da Vila quero ressaltar o desempenho do seu puxador, o bravo Tinga. Tinga tem talento, mas acho que exagera nos cacos, que são aqueles gritos que o puxador usa para animar a harmonia da escola. Tinga cantou pouco o elogiado samba da Vila deste ano. O ponto alto do ensaio da escola de Noel foi em minha opinião, a apresentação do casal de mestre sala e porta bandeira Ruth e Juninho que deram um show na avenida.
               É isso aí galera! Final de semana tem mais ensaios...até lá!               

Obra de jovens escritores preenche uma lacuna na literatura sobre escolas de samba

     No último dia 17 estive no lançamento do livro as três irmãs, de autoria de Alan Diniz, Alexandre Medeiros e Fabio Fabato. A festa foi muito bem prestigiada pelo mundo do samba. Estavam lá nomes como a inesquecível Pinah, Tiaozinho da Mocidade, Dominguinhos do Estácio, Velhas Guardas, Carnavalescos e etc. Tal fato teve sentido, pois a obra produzida por esses jovens intelectuais do samba é de ótima qualidade.
     Como pesquisador de Escola de Samba fico feliz que a Editora Nova Terra tenha abraçado esse projeto e ajudado a materializar este livro que vem preencher sem dúvida nenhuma uma lacuna que existia na literatura sobre escolas de samba. Beija Flor, Imperatriz e Mocidade romperam com o modelo de carnaval que vinham se fazendo até então e no qual Mangueira, Portela, Salgueiro e Império Serrano monopolizava as atenções e eram as maiores papas títulos.
     Alexandre, Alan e Fabato, tiveram a sensibilidade de narrar está revolução trazida pelas três irmãs com leveza, criatividade e muito talento.
     Já comecei a ler o livro e, no capítulo denominado os três espantos da criação Alan Diniz, foi extremamente feliz ao enxergar um determinismo quase cabalístico na relação das três escolas retratadas no trabalho com seus os carnavalescos. Segundo o autor, Arlindo Rodrigues, Joãosinho Trinta e Fernando Pinto foram feitos para as suas respectivas escolas que trabalharam e se consagraram. Arlindo para a Imperatriz, Joãosinho para a Beija Flor e Fernando para a Mocidade.
     Arlindo fez um casamento perfeito com a Imperatriz, segundo o autor, pois seu carnaval clássico e linear tinha a cara da escola da Leopoldina. Foi a dose perfeita para fazer uma nobre escola se sentir mais pomposa e garbosa.
Joãosinho Trinta vai transformar a Beija Flor de uma escola ‘’chapa branca “dos governos militares em matriz da imaginação anarquizante. Ratos e Urubus sem dúvida foi auge deste novo momento da escola de Nilópolis.
     E Finalmente Fernando Pinto, revolucionou a mocidade, que a partir da sua chegada, deixa de ser uma escola cercada de bateria, para se tornar uma escola organizada e luxuosa. Com seu tropicalismo imaginativo Fernando revelou um Brasil louco, mas livre da colonização estrangeira.
     Por todos esses singelos comentários feito sobre a obra desses rapazes é que recomendo a leitura deste livro, lançada por este talentoso trio de escritores.

Sambas de enredo 2012 do Grupo Especial: uma das piores safras da história do gênero


     Neste final de ano como de costume, comprei o CD das escolas de samba do grupo especial, versão 2012. Ao escutar fiquei decepcionado com a qualidade das obras apresentadas.
     Começando, por uma analise do samba da atual campeã Beija Flor, ele tem uma letra que embora, não fuja muito do senso comum, do uso de adjetivos e substantivos que já estão surrados no universo do samba, tem uma poesia minimamente apreciável, mas fica muito longe de outras obras da escola de Nilópolis produzidas, por exemplo, na década de 2000.
     Escutando o restante do CD, cheguei à conclusão, que é uma das piores safras dos últimos anos do grupo especial. Os sambas da Mangueira e da União da Ilha do Governador são de fazer chorar qualquer amante da ala de compositores destas duas fabulosas escolas.
     O samba da Mangueira tem um repetido sim no intervalo de uma frase, na segunda estrofe do samba, que ficou ridículo sonoramente. O ultimo refrão, vem com um jargão do tempo do Jamelão. Eu sou Mangueira, “a voz do morro”. Totalmente batido.
     “A União da Ilha, que já teve obras do quilate de “Domingo”, “O Amanhã”, O que será”? E É hoje, Vem para o carnaval 2012 com um samba sofrível. A melodia é parecida com a dos três últimos sambas da escola e, sua dissertação chega a ser bizarra em alguns momentos. Molho inglês no meu parco conhecimento culinário se bota num belo bife e não, na feijoada como diz a letra do samba.
      Agora, fazendo uma analise mais profunda do porque de tanta mediocridade num disco de samba enredo, não dá para botar tão somente na conta da mercantilização do concurso de samba ou na falta de qualidade e imaginação de alguns compositores. É preciso questionar a produção e gravação do disco de samba enredo.
     A indústria cultural transformou os sambas enredos em algo sem alma e identidade e o mais grave com a ajuda e consentimento de sambistas.
    Para encerrar, quero falar do samba da Portela que está sendo considerado pela critica como o melhor samba da escola de Madureira das ultimas décadas. Já vi gente falando que este samba é melhor do que de 1984 e 1995 da Portela. Em minha opinião isto é uma heresia. O samba 2012 da Portela é um bom samba que comparado com a baixíssima qualidade das outras obras deste ano, vira na cabeça de alguns marinheiros de primeira viagem, uma obra prima que não é na verdade.
    Analisando o samba da Portela podemos ver que o enredo é super batido, e sua poesia é trivial e óbvia. Mas o que surpreende  negativamente no samba da Portela de 2012 é sua melodia sem estética sonora. Se compararmos a melodia deste samba como o Gosto que me Enrosco de 1985, O ultimo da um banho de emoção sobre o primeiro.
   Esta na hora de nós amantes do samba enredo, alertarmos para onde estão levando o gênero musical que se transformou em trilha sonora da nossa História. Se não rompermos com este paradigma pasteurizado e sem imaginação o samba enredo vai desaparecer como os dinossauros da face da terra.              

A morte do gênio da raça


Joãosinho Trinta (foto: reprodução)
       O Brasil perdeu ontem o seu gênio da raça. O visionário e revolucionário Joaosinho Trinta. Este maranhense que assombrou em 1974 o carnaval carioca com seu enredo Rei França Na Ilha Da Assombração.
       A partir daí, os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro não foram mais os mesmos. Com suas imensas alegorias, mulheres seminuas e fantasias luxuosas, João cria uma espécie de fôrma que foi copiada pela maioria dos carnavalescos chamados modernos.
      Mas falar de Joãosinho Trinta para mim é sem duvida nenhuma relembrar aquele que foi ao lado de Quizomba A Festa Da Raça da Vila de Martinho, os dois maiores desfiles da história do sambódromo. Estou me referindo ao antológico desfile da Beija Flor de Nilópolis de 1989: “O famoso Ratos e Urubus larguem minha fantasia”.
      Em Ratos e Urubus, Joãosinho como se estivesse conversando consigo mesmo, escreve um enredo que vai, de certa maneira, negar aquele tipo de carnaval implementado por ele. Cujo biônimo, foi baseado na formula luxo e beleza. O próprio nome do enredo sugere esta reflexão. Os ratos e urubus na metáfora carnavalesca de João representava a estética do feio que ele, sempre escondeu dos seus enredos fantasiosos e lúdicos. Esta faceta esnobe do artista fez inclusive ele falar aquela “pérola” de quem gostava de pobreza era o intelectual, pobre gostava era mesmo de luxo.
     Classifico esta infeliz frase de João como pérola, devido ao fato de ele ter esquecido que o maior legado deixado pela escola de samba foi o samba e que este, foi fruto justamente da criação do pobre morador do morro. O sambista proletário valorizou primeiro a cultura dele e não a grana da burguesia. Foi a figura do carnavalesco, no qual, João foi um dos pioneiros, que introduziu a supremacia da ‘espetacularização’ do desfile em detrimento do samba no pé do pessoal excluído do morro.
     Portanto, ao trazer para a Marques de Sapucaí um tema que homenageava na sua essência os humildes moradores de rua, João se retratava com a bobagem que ele tinha falado. Como intelectual vindo das classes menos favorecidas João ao fazer este enredo revolucionário, contempla em sua obra duas característica inovadoras para seu trabalho: o realismo e o teor social do enredo.
     Para entendermos o impacto de Ratos e Urubus na mudança de visão de João, temos que contextualizar este enredo no panorama político do Brasil da época.
      Depois de anos de ditadura civil – militar, o Brasil voltava a ter um sistema político que apesar de não representar nem de longe os anseios populares, mas trazia de volta pelo menos, a chance da verbalização da critica sem restrições. E foi aí que João mudou sua filosofia carnavalesca. Trazendo para aquele carnaval de 1989 uma releitura dele sobre o Brasil contemporâneo.
      Ratos e Urubus ao adentrar na Marques de Sapucaí se transforma numa espécie de fantasma para a burguesia retrógada brasileira, principalmente a reacionária Igreja Católica que desesperada em ver Jesus Cristo compartilhado na invenção social carnavalesca, com os profanos mendigos produto da sociedade de consumo, não tem alternativa a não ser censurar a obra de João. 
     É como se o desfile da Beija Flor revelasse para todo o Brasil naquele momento, o inconsciente das elites brasileiras, que foi escondido o tempo todo pela ação de poder do Estado. Cristo não poderia ser adorado pelos “estranhos” produzidos pelo “bárbaro sagrado sistema civilizado”.
     Quis o destino que a Beija Flor naquele ano perdesse o carnaval para o desfile “chapa branca” da Imperatriz Leopoldinense.  Apesar de ter o samba mais bonito daquele ano, a escola da Leopoldina trazia para a passarela do samba, um culto ao Estado brasileiro. Contemplando a República com sinônimo de liberdade e fraternidade. Algo totalmente avesso ao que a Beija Flor levou para a avenida.
    A derrota do carnaval revolucionário de João concretizou- se na nota equivocada do jurado de samba enredo. Ele tirou pontos da obra da Beija Flor, alegando que sua letra do refrão não tinha relação com o enredo. Tal atitude do jurado revelou o total despreparo intelectual destas figuras no trato de julgamento do quesito em disputa.
    A letra tinha tudo a ver com o enredo porque a palavra legba ou mais propriamente elegbera é um dos nomes de Exu – orixá habitante das ruas, que inclusive se manifesta nos mendigos, segundo a crença popular.
   Para encerrar digo que Ratos E Urubus entrou para a História do carnaval carioca, pois revelou uma faceta deste gênio da raça que nem ele tinha muita noção que existia, mas, que foi trazida a tona junto com toda aquela enxurrada de transformações que a História brasileira estava expelindo.
    Obrigado por tudo mestre João!